Inconformados com os riscos diários, moradores realizaram, ontem, um protesto, interrompendo o trânsito na BR-116
Sem passarelas, lombadas eletrônicas ou outros equipamentos que permitam aos pedestres cruzar a via com segurança, a BR-116, na altura do quilômetro nove, tem sido palco frequente de atropelamentos. Nos bairros adjacentes ao trecho, moradores lidam diariamente com um misto de medo de serem as próximas vítimas e de dor pela perda de parentes e amigos, vítimas da violência do trânsito.
Para cruzar aquele trecho da via, mesmo em horários de menor fluxo, é necessário uma longa espera para atravessar com relativa segurança. A travessia até o canteiro central tem de ser feito em poucos segundos devido a largura da pista e a alta velocidade dos veículos.
Somente em 2010, segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), 1.695 acidentes ocorreram na BR-116, com 121 mortes. Na BR-222, o número de colisões foi de 1.366 com 96 óbitos. De acordo com o órgão, não foi possível, ontem, por conta de uma falha no sistema de dados, informar quantos atropelamentos foram registrados neste ano.
Ainda, segundo a PRF, não há como indicar quais são os pontos mais críticos da rodovia, pois todos os 20 quilômetros da BR-116 (perímetro urbano que envolve a Capital e a Região Metropolitana de Fortaleza), são considerados perigosos, reconhecendo assim a frequência elevada de atropelamentos e acidentes ao longo de toda a via.
A assessoria de imprensa da PRF comenta que a maior ocorrência de atropelamentos e de acidentes naquela via é devido o aumento de fluxo, tanto de veículos como de pedestres naquela rodovia, que por sua vez não conta com uma estrutura adequada para acompanhar esse crescimento. “Sem dúvida, os pedestres, ciclistas e motociclistas são os mais vulneráveis e consequentemente, os acidentes em que eles se envolvem, ocasionam mortes ou lesões muito graves”, diz a assessoria.
A PRF informou ainda que os trechos compreendidos entre os quilômetros zero a 20 da BR- 116 e a continuação da Avenida Mister Hull, que dá acesso a BR- 222, são responsáveis por 40% de todos os acidentes registrados nas rodovias federais no Ceará.
Reivindicação
Ainda não tendo superado a angústia causada pela perda da mãe, os irmãos Ernane de Assis, que trabalha como mototaxista, e Francisco de Assis Neto, vendedor ambulante, afirmam que a população há anos reivindica a construção de uma passarela no local, sem sucesso.
Conforme Ernani, a mãe – Raimunda Matos de Assis, de 77 anos – faleceu há 13 dias, após ser atingida por uma moto enquanto tentava cruzar a rodovia. A idosa chegou a ser socorrida e encaminhada a um hospital, mas não resistiu. “Dinheiro nenhum vale uma vida perdida. Não sei porque Prefeitura, Estado ou quem quer que seja não se juntam e não tomam alguma providência aqui”, questiona.
Decididos a suspender o luto e evitar novas mortes, os irmãos se juntaram a outros residentes da região e participaram, na manhã de ontem, de uma manifestação originada da indignação quanto à frequência com que ocorrem acidentes como o que vitimou Raimunda Matos.
Durante o protesto, moradores dos bairros Cidade Nobre, Parque Betânia, Messejana e Jangurussu apresentaram faixas alertando sobre a situação, incendiaram pneus e interromperam, por cerca de 40 minutos, o trânsito da rodovia.
Segundo os manifestantes, um dos principais fatores que contribuem para tornar a travessia perigosa é uma curva localizada próximo à placa que indica o quilômetro nove da BR. Segundo eles, os acidentes ocorrem porque nem os veículos, prestes a realizar a conversão, conseguem ver os pedestres que estão no canteiro central, e muito menos estes enxergam os carros, motos e caminhões que se aproximam. Com isso, a maior parte dos acidentes registrados no trecho ocorre logo após a curva.
Conforme o líder comunitário Djacy Rodrigues, desde a última quinta-feira, houve pelo menos quatro atropelamentos no local. “Enquanto não fizerem alguma coisa, vai continuar tendo acidente”, ressalta.
O inspetor Flávio Falcão, chefe do Núcleo de Operações Especiais da PRF, comenta que alguns pedestres, especialmente durante a noite, tentam atravessar a rodovia alcoolizados, fato que também contribui para os atropelamentos. Segundo ele, a sinalização do local é adequada, mas, devido à curva no trecho, existe a necessidade de serem montadas passarelas.
Sem citar prazos, a assessoria de comunicação do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes no Ceará (Dnit) informou que o órgão “elabora um projeto” que prevê a construção de passarelas e a recuperação de estruturas já existentes em rodovias federais, entre elas a BR-116. Quanto à instalação de radares naquele trecho, conforme a assessoria, não há nenhuma previsão.
Acidentes
1.695 foi o total de acidentes que ocorreram, em 2010, na BR-116. Destes, 121 pessoas morreram. Na BR-222, em igual período, aconteceram 1.366 colisões.
Enquete
Perigo recorrente
“Já perdi muitos amigos atropelados nessa rodovia. Morre gente quase todos os dias. É uma situação terrível”
Carlos Alberto Araújo
60 anos
Comerciante
“A falta de passarelas faz com que a gente se arrisque entre os carros. Quem mais sofre e corre perigo somos nós, os pedestres”
Manoel Sales
52 anos
Gerente de produção
“A gente demora mais de 40 minutos para atravessar. Aqui não tem proteção nem para os pedestres nem para os ciclistas”
Carlos André Maciel
34 anos
Entregador
Fonte: Diário do Nordeste