Inflação deve sofrer uma pressão maior com valores mais altos, de acordo com a avaliação de setores produtivos
Congresso aprovou MP para apaziguar os ânimos dos caminhoneiros ( Foto: José Leomar )
Além do impacto econômico negativo causado pela paralisação nacional dos caminhoneiros em maio e junho, a aprovação da Medida Provisória que permite o estabelecimento de preços mínimos para os fretes rodoviários deverá pressionar a inflação, na medida em que encarece os custos logísticos de toda cadeia produtiva, desde o transporte de insumos até o dos produtos ao consumidor final. Para alguns setores, a medida, aprovada pelo Congresso na última quarta-feira (11), poderá fazer com que produtos do Norte e Nordeste percam competitividade nos mercados do Sul e Sudeste.
Na avaliação do economista Alex Araújo, como uma grande parcela do preço dos produtos consumidos no País são referentes ao transporte rodoviário, o tabelamento do frete aumenta o risco de termos sobrepreço dos produtos. “A discussão que ainda vai permanecer é se esse é um aspecto que pode ou não ser regulado. Há uma discussão no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre esse tema que permanecerá até que haja um parecer definitivo, porque, de modo geral, os preços são livres”, avalia Araújo.
MP do Frete
Alternativa é ineficaz e deve gerar prejuízos a empresas
> Tabela de frete eleva preços e ameaça competitividade do NE
“A última tabela de frete aumentou em torno de 150% (o valor cobrado pelo trecho entre o Nordeste e outras regiões do País). O impacto nos preços dos produtos produzidos aqui no Estado será grande. Não tem como a transportadora arcar com esse custo, terá que repassar para o embarcador, e será um valor elevado”, disse.
Na opinião de Espedito, já será possível perceber variações de preços nos produtos no entre este mês de julho e o próximo mês de agosto. “Tem produtos que o consumidor sente mais rápido, mas a tendência é que a inflação no fim de julho e começo de agosto já sinta, pois os fretes precisarão ser renegociados”, apostou.
Para gerente do SETCARCE, “o livre mercado seria mais interessante, e não o tabelamento de preço, embora que o mercado também esteja precisando de um reajuste, uma equalização, pois está com preços bem abaixo do que deveria ser cobrado”, ponderou. Já o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Fortaleza (CDL), Assis Cavalcante, ressaltou que os aumentos sempre são repassados nos preços dos produtos para o consumidor final. “O frete compõe o preço de custo, que é formado ainda por imposto, aluguel, energia e valor do produto pago ao fornecedor. O frete é um dos elementos. No momento em que a indústria embutir o custo do frete, certamente, vai absorver para o produto. Não tem mágica. Se a mercadoria chegar hoje, com o preço diferente do que estava na prateleira, já irá com o preço diferente”, detalhou o empresário.
O primeiro secretário da Câmara Temática de Logística do Ceará (CT Log Ceará) da Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece), Bruno Iughetti, aposta em um impacto em toda a cadeia produtiva. Para ele, a MP veio na hora errada.
“Essa MP vem em momento inoportuno, pois com absoluta certeza, isso pode ter impacto nos fatores de frete. E, consequentemente, um impacto em toda a cadeia produtiva. O nivelamento ou tabelamento do frete é algo que produz um efeito contrário. O que se pretende é que haja um livre mercado e a livre negociação é a maneira mais inteligente e melhor equilibrada que nós podemos apontar para essa questão”, citou.
Médio prazo
Iughetti diz enxergar os impactos no médio prazo. “Uma coisa é a questão de implementar as medidas, e os efeitos começam a aparecer no médio prazo. Não tenho dúvidas que isso merece ser revisto para justamente eliminarmos, ou pelo menos reduzirmos, os impactos que se apresentam pela frente”.
Como efeitos, ele cita o reflexo na precificação de toda a cadeia logística. “Isso vai ter um impacto direto na cadeia. E, consequentemente, havendo esse impacto direto, os efeitos se farão notar em toda a economia brasileira”, asseverou. “Eu vejo uma dificuldade grande para nós, principalmente, não só no Estado do Ceará, mas para os estados da Região Nordeste. A questão é a distância dos estados nordestinos para os centros de consumo das regiões Centro-Sul e Sudeste. O impacto vai se fazer mais presente nessas regiões e, consequentemente, nós seremos atingidos”, advertiu o primeiro secretário da CT Log.
Segundo o empresário Tom Prado, CEO e sócio da Itaueira e coordenador do Comitê Técnico de Fitossanidade da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), além de onerar todo o setor produtivo e, consequentemente o consumidor, o tabelamento prejudicará ainda mais as empresas do Norte e Nordeste que enviam seus produtos para o Sul do País.
“A nossa opinião é que, aparentemente, os deputados das regiões Norte e Nordeste não se deram conta de que os fretes são altos do Sul para o Nordeste e baratos do Nordeste para o Sul, viabilizando a produção na nossa região. E com o tabelamento nós perdemos esse incentivo”, aponta o empresário.
Perdas vão reverter decisão
Prado acredita, no entanto, que a medida poderá ser revertida, uma vez que, inevitavelmente, causará prejuízos econômicos, com a perda de competitividade, de emprego e renda para a região. “Quando eles se derem conta do que aprovaram, vão perceber o tiro no pé que deram e talvez isso seja revertido pelos próprios políticos”, afirma.
Para os setores que comercializam produtos de baixo valor agregado, cujo peso dos custos logísticos é maior, o tabelamento causará ainda mais prejuízos. “O setor de material de construção, por exemplo, que trabalha com produtos de baixo valor agregado, sofre muito com o tabelamento e, muitas vezes, acaba inviabilizando o transporte”, diz Cid Alves, presidente do Sindicato do Comércio Varejista e Lojista de Fortaleza (Sindilojas).
“Infelizmente isso já está causando desabastecimento”, acrescenta, evidenciando o início dos impactos negativos da medida.
Serviços em queda
Segundo dados da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do IBGE, o volume de serviços no País caiu 3,8% na passagem de abril para maio, sendo a queda mais intensa desde o início da série histórica da pesquisa, em janeiro de 2011. Com forte peso do setor de serviços na composição do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, o governo já esperam menor crescimento da economia no ano. “Se ao final do ano tivermos uma taxa positiva no setor de serviços, ela poderia ter sido mais positiva se não fosse a greve de caminhoneiros. Se a taxa for negativa, ela poderia ter sido menos negativa. Algumas perdas não vão ser refeitas nos próximos meses. Alguma coisa se perdeu que não vai voltar atrás”, disse Rodrigo Lobo, gerente da Coordenação de Serviços e Comércio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O mau desempenho em maio foi puxado pelo tombo também recorde de 9 5% registrado pelo segmento de transportes, serviços auxiliares ao transporte e correio, embora as perdas tenham sido generalizadas entre todas as atividades pesquisadas.
“Mercadorias que não foram escoadas naquele período não serão mais, isso se perdeu”, afirmou. O transporte terrestre, que inclui os caminhões, despencou 15,0% em maio ante abril, queda também recorde, afetando outros serviços subjacentes.
Medida provisória
O texto aprovado no Congresso Nacional vai agora à sanção do presidente Michel Temer. Foi incluída na matéria a anistia às multas de trânsito aplicadas aos caminhoneiros e empresas de transporte que não retiraram seus caminhões das rodovias entre os dias 21 de maio e 4 de junho deste ano.
A medida determina que os preços mínimos do frete devem refletir custos operacionais do transporte e devem ser divulgados a partir de regulamentação da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), incluindo custos referentes ao óleo diesel e aos pedágios. A Agência deverá publicar os preços mínimos levando em consideração as distâncias e especificidades de algumas cargas.
A nova tabela deve ser publicada pela ANTT sempre que acontecer oscilação no preço do óleo diesel no mercado nacional em mais de 10% em relação ao preço usado na planilha de cálculos dos preços mínimos.
O que eles pensam
O tabelamento é altamente negativo. Está havendo uma interferência nas relações de mercado, que deve ser regida pela lei da oferta e procura. E o impacto nos preços para alguns setores, principalmente os de produtos de baixo valor agregado, é crítico. Essa é uma situação que o governo perdeu o controle. Tabelamento nunca deu certo.
Cid Alves
Presidente do Sindilojas
A discussão que ainda vai permanecer é se esse é um aspecto que pode ou não ser regulado. Há uma discussão no Cade que permanecerá até que haja um parecer definitivo, porque, de modo geral, os nossos preços são livres. Com o tabelamento há risco de termos sobrepreço, por causa da dependência de transporte rodoviário e de seu peso nos preços.
Alex Araújo
Economista
O que nós visualizamos é uma situação que sobra para o consumidor. Impacta em contratos firmados anteriormente. Talvez haja inflação lá na ponta e quem vai pagar isso é o consumidor. Agora, é de responsabilidade dos governos atentar aos impactos para toda a cadeia produtiva. E haverá impactos, principalmente, para o comércio.
Maurício Filizola
Presidente da Fecomércio