Estradas fingidas

Brasília (Alô) – Uma recente vistoria do Tribunal de Contas da União em estradas federais me fez pensar na frase que ouvi de um empreiteiro: “o governo finge que nos paga e nós fingimos que fazemos estradas”. Não sei como é o fingimento de pagar as contas devidas pelo governo, mas, sem dúvida, conheço bem o que são estradas fingidas. E o TCU também conhece. A vistoria apenas tangenciou a realidade: em quase 80 mil quilômetros de estradas federais, visitou menos de mil quilômetros, em oito Estados. Ainda assim, a amostragem assustaria um português, ou um italiano, ou um chileno que pretenda alugar carro para fazer turismo pelo Brasil ou para assistir aos jogos da próxima Copa das Confederações. 
O TCU fiscalizou estradas que receberam recentes obras de manutenção, ao custo de R$ 740 milhões.Segundo o TCU, apareceram defeitos sete meses depois das obras, em média. Na BR-230, no Maranhão, apenas um mês depois, apareceram falhas nos serviços feitos. Para consertar tudo, o contribuinte teria que gastar R$ 159 milhões.A maior parte dos defeitos está em afundamentos, trincas e desgaste exagerado da pista. Qualquer leigo em engenharia, que tenha dirigido em estradas de verdade, percebe que boa parte das nossas estradas – talvez metade delas – são falsas.

Depois de dirigir sob tempestade na Flórida, observei a um amigo americano que a pista estava sem água acumulada e elogiei as construtoras americanas. Ele riu e me disse que a construtora daquela excelente estrada é brasileira.Perguntei-me por que não fazem estradas assim no Brasil. O americano, conhecedor da alma brasileira, deu a resposta: “porque vocês não controlam, não fiscalizam: Pagamos um dinheirão de impostos. Por ano tem sido mais de R$ 1,5 trilhão em impostos, inclusive a Cide. Com o que pagamos, teríamos direito a excelentes estradas, como aquelas em que transitamos quando visitamos nossa pátria-mãe, Portugal. No entanto, temos estradas que afundam …

Meu amigo português conta que a nova estrada que passa diante da quinta dele tinha um trecho com trepidação. 
Foi tudo refeito, com escavações profundas, para dar base mais sólida e fundação mais confiável à via. Por aqui, a BR-060 entre Brasília e Goiânia desmoronou no fim de 2010 porque as bases foram lança das sobre uma mina dágua. Meu amigo de Portugal perguntaria: “e vocês fazem piadas de português?” Quanto à queixa do empreiteiro sobre o governo fingir que paga, não quero nem pensar que o dinheiro original da estrada seja lançado sobre uma base moral erodida pela água que molha mãos. Porque os que usam as estradas não fingem que pagam impostos.

Fonte: Revista CNT.